quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Sete Além

 Era uma daquelas manhãs frias. Passei no mercadinho, comprei umas porcarias, salgadinho, chocolate, chicletes, essas coisas pra fazer o tempo passar na viagem. Sentei na área de embarque para Ilha do Mel e fiquei observando as  Barcas que chegavam e saiam, bem vazias, como era para se esperar numa manhã de quinta feira fora de temporada. Podia ficar horas ali sem cansar, mas, deu horário do meu ônibus e fui esperar o Graciosa. Chegou um ônibus enorme, daqueles com dois andares. Minha poltrona era a 7, lá em cima, reclamei da escada pro motorista que apenas olhou minha identidade e conferiu minha passagem, sem responder.

Ônibus vazio. Sentei, prendi meu cinto, coloquei meus fones e liguei na conta gratuita do Spotify. A cada duas ou três músicas, um comercial, até que no lugar de tocar a minha seleção iniciou um Podcast. Ia mudar pro Yt music, porém o assunto, sobre Sete Além, me chamou atenção. Fui escutando e vendo a paisagem tão conhecida por mim, ficar diferente, era realmente sugestionavel. O ônibus parou onde deveria ser Praia de Leste e algumas pessoas entraram no ônibus, deveria ser mais do mesmo, se não fosse o ar pesado, e o olhar desconfiado da senhora que ao meu lado sentou.

- Você não é daqui, né? Me perguntou. Pergunta que não sei porque fez meu corpo gelar e tremer sem motivos. 

Eu não conseguia ver mais nada, até que chegamos numa paisagem cinzenta, estava frio, chovia. Desci do ônibus na rodoviária e fui até o banheiro, não lembrava ser tão sujo, não ter assentos e cheirar tão mal. Lavei as mãos. Tive fome, procurei uma lanchonete ainda dentro da rodoviária pedi por um salgado, disse bom dia, porém ninguém me respondeu. Dei a primeira mordida e percebi que o salgado era simplesmente horrível, com gosto de velho, murcho, sem sabor. 

Eu sei o que vocês estão pensando, o título da história,o podcast e tal, toda essa cidade em tom cinza, pessoas sem me responder... Pois é,  estava lá mesmo, cheguei em Curitiba!

sexta-feira, 26 de maio de 2023

Tudo pode acontecer. - Parte 15- Quem são elas, Beth

 - Mimi, Orion, Poente, Gigi! Olha o petisco! Fico com dó no coração de deixar vocês meus gatos lindos!!! Mas a tia Lurdes vai cuidar de vocês!

- Vou sim, querida! Não se preocupe, foque no seu Congresso em Goiânia, dos bichanos cuido eu!

- Obrigada, tia! Pode me fazer mais um favor? Pode me emprestar a bengala que usou quando operou o joelho? 

-Claro, mas para que você precisa? 

- Uma amiga minha, torceu o pé. Mas é por pouco tempo...

- Tá, tá, imagine, que use o tempo necessário, eu espero jamais precisar de novo!

-Amém, tia! E obrigada por tudo.

Beth pega a mala arrumada na véspera, leva maquiagem, perfumes, os mais bonitos vestidos e sapatos. Ficará hospedada num hotel de luxo, precisa estar impecável.

Coloca a mala no carro e vai em direção ao apartamento da amiga Margot. A outra já a espera. Beth dirige até o Aeroporto, ficarão esta noite em Goiânia,  em reunião de acertos com a chefia, depois partem pra Brasília. Chegam ao aeroporto Afonso Pena, Região Metropolitana de Curitiba.  Beth entrega a bengala a Margot.

- Toma, é pra você, faz parte do teu disfarce.

- Injusto isso! Você chiquerrima num hotel e eu jogada ás pulgas! 

- Para de reclamar, mulher, na próxima, trocamos.

As duas aguardam na fila para entrar no Avião, um funcionário da Azul se aproxima de Margot que aborrecida, largou a mochila no chao e se apoiou na bengala.

-Senhora, por gentileza,  me acompanhe. A senhora não precisa ficar na fila, tem prioridade! Posso pegar sua bagagem?

-Claro, obrigada!

Beth fica sozinha na fila, com olhos arregalados. Pensa: - Sim, Margot é excelente no que faz, já encarnou a personagem! Espera eu contar isso na reunião!!!

Tudo pode acontecer- Parte 14- Quem são elas, Margot..

 Margot apaga o fogão, é uma panela enorme de feijão cozido. Já deixou legumes congelados, saladas cortadas e lavadas em vidros reutilizados de conserva na geladeira. Lazanhas congeladas, pudim de leite, a criança adora pudim de leite! Despede-se do marido, que ainda insiste para ela não ir:

-É sempre o mesmo, Margot! Essa advogadazinha tua chefe é muito folgada! Por que não vai sozinha? É sempre igual! Outro marido corno atrás de provas,  numa cidade sei lá onde e vai você viajar com a Elizabeth. Por que ela não arruma alguém, uma agência de detetives,  isso, uma agência de detetives pra fazer essas coisas pra ela? Não é a maior empresa de advogados do Paraná? Não pode pagar?

-Detetives? Quase engasguei aqui!! Cada ideia que você tem!!! Olha, vc sabe que a Beth não dorme sozinha em quarto de hotel. Já te expliquei que quando ela era pequena teve aquele lance dela estar sozinha no quarto e um homem invadir, tentar levar ela a força, algo tipo  Madelaine Macann... E é um cliente importante, político lá de Goiás, não dá pra confiar em terceiros. Tava pensando aqui, no Mario Fofoca, com ternos quadriculados investigando em um hotel de luxo...

- Quem é Mario Fofoca?

- Ah, pensei que você soubesse! Um personagem de novela, acho que dos anos 80.

- Você assistia novela?

-Quando era criança, sim!

Margot, vai pro quarto, pega uma mochila velha e nela coloca uma escova de cabelos, um par de meias furadas, uma havaianas já gasta, uma legging, camiseta e moleton que usa pra dormir. Olha pro carregador do celular. Sim. Vai levar. Discretamente coloca os cartões de crédito, o cartão do convênio médico dentro da carteira e guarda no armário. Pega apenas a identidade, o cartão do SUS e coloca na capinha do celular. Serão dias difíceis, mas o dinheiro desse trabalho pagará a tão sonhada viagem para Itália. Que Deus me proteja, diz baixinho. Volta para cozinha. Despede-se do marido e da filha. Nem quer ir mais, mas precisa!

quarta-feira, 24 de maio de 2023

Tudo pode acontecer- Parte 13

 - Então,  minha querida Ingrid, eu pensei em você por trabalhar de forma autônoma e não ter ligação com a polícia de qualquer forma. Gutierrez não é santo, nunca foi. Mas, especificamente neste crime a que atribuíram autoria a ele, é inocente. Na época do suposto crime, a suposta vítima, chamado Agenor das Neves, vulgo Cazuza, devia uma grana alta para o patrão do Gutierrez. Gutierrez costumava cobrar esse tipo de dívidas e com esse sujeito não foi diferente. Deu um "susto " no tal Cazuza como um primeiro aviso. Infelizmente foi visto por testemunhas ao abordar o sujeito num bar que tinha câmeras escondidas. Após o susto o sujeito sumiu, fugiu, sei lá.  Dias depois um corpo totalmente carbonizado foi encontrado na região. Não pode ser reconhecido por DNA ou arcada dentária mas a família reconheceu um pedaço de relógio de metal próximo do corpo e o enterraram como se realmente fosse Agenor. Gutierrez foi condenado por assassinato. Fugiu de Pernambuco e começou a trabalhar comigo aqui no Paraná. Contou todos os detalhes dessa história para mim quando decidi montar a empresa de segurança. Gutierrez sempre foi fiel a mim, sempre foi sincero. No mais, o antigo patrão e padrinho do Gutierrez, mandou seus próprios homens investigarem toda essa história e descobriram que Agenor teria comprado 1 passagem de ônibus em cidade próxima a Santa Cruz do Capibaribe dias depois de ter sido supostamente enterrado, ou seja, está mais que claro que após apanhar e receber ameaças de Gutierrez o sujeito fugiu pra não pagar as dívidas e Gutierrez esta fugindo pra não pagar por um crime que não cometeu. Os funcionários do padrinho descobriram que Cazuza estaria morando em Brasília, como andarilho, morador de rua, usando inclusive uma alcunha de que já foi chamado em Santa Cruz,  Gaiato. 

Padrinho tem uma foto dele, mais magro, barbudo, sujo, porém facilmente reconhecível, saindo de um restaurante popular em Brasília. 

O que preciso de você é simples. Preciso de uma campana em Brasília, pra pegar o Cazuza, provar que ele está vivo e absolver o Gutierrez. Padrinho tem bons homens, porém, são todos como uma família, unidos a décadas ao padrinho. E o Agenor já foi funcionário do padrinho que o traiu numa negociação e ficou com um dinheiro, quantia grande. Foi aí que o padrinho mandou Gutierrez ir atrás pra cobrar e começou toda essa encrenca... Padrinho nunca perdoaria uma divida assim, de traição. Gutierrez talvez até poderia dar fim no sujeito mas a ordem do padrinho foi dar um susto para tentar reaver o dinheiro. Gutierrez é um homem sensato, nunca faria algo além das ordens do padrinho. Não matou esse cara. Por isso preciso de você. Sem polícia envolvida. É campana, provas de vida do Agenor e o resto eu e nosso advogado resolvemos. Dinheiro não é problema, use quantas pessoas precisar. 

Gutierrez não é apenas meu noivo. É a pessoa em quem mais confio neste mundo, é meu melhor amigo, meu sócio. Não só eu, mas também o padrinho queremos tudo isso resolvido o mais breve possível. Pode resolver isso pra mim?

- Claro, Su! Alguma vez te deixei na mão? Você sabe que minha agência é reconhecidamente a melhor agência de detetives do país. Tenho as pessoas certas pra colocar nesta campana. Você pode passar aqui no meu escritório para assinar o contrato e claro, tomar um café pra matar a saudade? As quinze horas de hoje tá bom pra você?

- Tá ótimo, amiga! Estarei aí. Beijos.


* Confiança é algo que se tem ou não. Algo que rompido, jamais será igual. Suzana confiaria sua vida a Gutierrez. Talvez, somente a Gutierrez. Nas próprias palavras de Suzana, sabemos que Gutierrez não é nenhum santo. Que teria matado Agenor sem ao menos piscar, se esta tivesse sido a ordem do padrinho. Mas, não foi.

** Como um homem bruto como Gutierrez conquistou o coração gelado de nossa heroína capricorniana? Há coisas, que só Suzana poderia entender...


domingo, 16 de abril de 2023

Tudo pode acontecer-Parte 12 (Malditos Proclamas!)

 Tudo certo para o casamento, documentos entregues no cartório,  Suzana recebe a visita do amigo Nelsom, delegado Civil que fez escola de polícia junto com Suzana em 1994.

- Estou chateado Suzana, mas tente me entender... Foi praticamente uma  brincadeira consultar nos Proclamas o nome do teu noivo, e sim, não há a mínima possibilidade de ser um homônimo, checamos RG, CPF, nome da mãe... Há realmente um mandado em aberto contra o Gutierrez, seu noivo,  lá em Santa Cruz do Capiberibe, em Pernambuco.

- Eu entendo amigo. Fique a vontade pra revistar o apartamento.

Exatamente dez minutos depois, Gutierrez recebe um WhatsApp de número desconhecido. A mensagem dizia:

Por Jesus, na Santa Cruz, a Páscoa acabou! O Coelho veio com ovos vermelhos. Páscoa é amor! 

Gutierrez não foi encontrado nem em sua casa, nem no apartamento de Suzana e nem na empresa. 

Malditos Proclamas!!


sábado, 8 de abril de 2023

Tudo pode acontecer- Parte 11.

 Suzana e Gutierrez têm uma breve conversa sobre o casamento.

- Nunca imaginei você querendo casar numa igreja, pensei num casamento civil, simples, apenas com as testemunhas...

- Fui educada em escolas de freiras, por mais inimaginável que isto apareça. Não que seja um sonho, ou algo assim. Só acredito que é o certo.

- Mas, Su? Um homem como eu? Alguém como você? Com tantos pecados mortais? Numa igreja?

- Você foi batizado, não foi?

-Fui. Mas aí eu era um bebê inocente...

- Você fez primeira comunhão, se crismou?

- Sim, minha mãe era muito católica. Fazia eu ir pra catequese. Fui até coroinha. Isso foi até uns treze anos. Com quinze fui trabalhar com o Juan Pedrito, e aí foi um outro tipo de batismo, do qual você sabe, não posso falar. 

-  Você se arrepende?  Do que sabe que pecou?  De A a Z, por exemplo. Você se arrepende? Poderia confessar? 

- Não. Não me arrependo de uma só letra, se é que me entende. Tudo que fiz por você,  faria novamente e novamente e novamente, letra por letra, vírgula por vírgula e principalmente ponto por ponto. Não sou homem de voltar atrás de minha palavra e nem de sentir remorso por algo que fiz. Sei exatamente o que fiz de certo e errado. Fiz tudo o que fiz por que desejei fazer, nunca fui obrigado e não me arrependo de nada.

- É. Pois é. Acho que o cartório será de bom tamanho mesmo. Esqueça tudo isso de igreja. Um churrasco depois, lá na chácara?  Chamo uns amigos pra tocar, só pra não passar em branco?

- Você que manda, patroa! Tava ficando nervoso com essa história de igreja, Ainda bem que você desistiu. 

-  Nervoso? Não consigo imaginar você com algum sentimento assim, sempre tão centrado, quase como um, como, 

- Um psicopata incapaz de ter qualquer sentimento?

- Não,  era isso. Não encontrei a palavra.

- Ah, Suzana, se você pudesse entrar em minha mente e em meu coração, saberia o quanto posso ter de sentimento. O quanto posso amar... Você, por exemplo... Você sabe que eu seria capaz de fazer qualquer coisa por você? Não sabe? Acho que já fiz  isso... Eu te protegeria de tudo e de todos, daria pra você qualquer coisa que você quisesse. Até casaria na igreja, se fosse tão importante pra você, não existe nada mais importante pra mim, do que te ver feliz!

-Eu sei, meu querido! Eu sei! Foi exatamente essa sensação de carinho, cuidados e segurança, sem me sufocar, que me fez olhar pra você com outros olhos e encontrar o amor. E isso, Guty querido, qualquer pessoa no mundo conseguiria entender... 

segunda-feira, 20 de março de 2023

29 de março

Dia 29 de março
dia de dar um grande abraço
na minha cidade querida
amada e sorridente Curitiba

Nasci na Maternidade Rosário
fui morar em frente ao Palácio
Sim, sou guria de prédio
Moro hoje na Praça Osório

Nasci nos anos 70
nos 80 passei a amar
Cidade que era tão segura
Que hoje ouso homenagear

Nunca saí daqui
aqui me casei
tive cinco filhos
que aqui também criei

Na Rua Vicente Machado
Pedagoga me formei
Como Educadora Social da Prefeitura
Por muitos anos trabalhei

Minha cidade e amiga
Hoje aposentada, continuo amando
A musa pra quem componho
Curitiba. 

Amo esse lugar
Que como qualquer capital, existe  problema.
Ainda acredito, de coração
Viver aqui, vale o poema.