segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Catarse

    Nem sabia direito porque havia ido. Por tantos anos deixando por isso mesmo. Talvez houvesse chegado o momento certo. Momentos são estranhos. Não sabia identificar o momento de quando tudo começou. E agora, de uma hora para outra precisava olhar nos olhos dele e falar tudo o que por muitos anos estava preso na garganta. Preso. Era isso. O que sufocava e o que a impedia de seguir em frente. Nem mesmo importava o que ia falar. Se é que falaria algo. Precisava apenas desafogar. Depois quem sabe, virar as costas e se permitir um novo momento. E tinha tanto para falar. Precisava coordenar os pensamentos. Senão já sabia. Não falaria nada.
     Precisava daquilo. Precisava. Claro que era uma ideia tosca. Mas pior do que ir ao encontro dele e falar, falar, colocar tudo para fora era continuar para sempre presa naquele mundo de fantasias. Ele podia até não querer ouvir. Ninguém é obrigado a escutar ninguém. Talvez quando exista uma relação. Mas não assim. Do nada. Um fantasma do passado pronto a desaguar mágoas de um mundo que nunca lhe pertenceu.
     Pensou por dias na roupa que ia vestir. Precisava estar linda. Por ela mesma, para sentir segurança. Pediu apoio para as amigas. A cor do esmalte, o batom. Tudo perfeito. Era o grande momento. A libertação final. Dali sairia uma nova mulher. Não esperava uma resposta dele. O mais provável era ele pensar que se tratava de uma louca. Era falar e ir embora. Deixar fluir cada sentimento que mantinha preso.
      Estacionou o carro. Tentou abrir a porta. Algo impedia todos os seus movimentos. Ouvia seu coração bater. A maquiagem escorrendo por causa das lágrimas. Estava em choque. Adiou a catarse.


http://www.youtube.com/watch?v=_Y7lPuUxqRM

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